Henrique Mendonça é o professor e idealizador do projeto ‘Mecanismos neuroplásticos da predisposição a convulsões após malformação do córtex cerebral’, que vem ganhando evidência em Macaé - Divulgação

‘Plasticidade Neural’ consiste na capacidade do sistema nervoso se modificar frente a algum estímulo

Visando auxiliar a saúde e o bem-estar das pessoas que sofrem de convulsões e epilepsias, Henrique Mendonça, professor de Histologia e Embriologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Campus Macaé, lança projeto sobre ‘Plasticidade Neural’, a fim de contribuir com o conhecimento dos mecanismos dos seus desenvolvimentos e facilitar a progressão de novos medicamentos para essas doenças.

Segundo Henrique Mendonça, ‘Plasticidade Neural’ consiste na capacidade do sistema nervoso se modificar frente a algum estímulo. Esse estímulo pode ser a experiência normal da vida do indivíduo, como um aprendizado em sala de aula, decorar um telefone de alguém querido, reconhecer o rosto de um conhecido, aprender a andar de bicicleta, tocar um instrumento ou pegar aversão a um alimento que te faz passar mal. Todas as adaptações do sistema nervoso requerem a modificação de suas células e como elas se comunicam umas com as outras.

“A principal célula a sofrer tais adaptações no sistema nervoso são os neurônios, que se comunicam uns com os outros, através de estruturas chamadas sinapses. A partir de diversas informações do ambiente externo, os neurônios mudam seu padrão de conexão uns com os outros, alterando a força de cada sinapse ou o número de sinapses que um neurônio faz com o outro e, ainda, altera com quais neurônios ele se comunica”, ressalta.

Idealizado por Henrique, que também é biomédico, mestre e doutor em Neuroimunologia, pós-graduado em Ciências Fisiológicas, pós-doutor em Medicina: Anatomia Patológica e professor dos programas Multicêntrico de Pós-graduação em Ciências Fisiológicas do Laboratório Integrado de Morfologia / Instituto de Biodiversidade e Sustentabilidade – Nupem e Pós-graduação em Medicina: Anatomia Patológica da UFRJ, o projeto conta ainda com a contribuição intelectual dos professores Paula Campello-Costa, Kimberle Jacobs e Ana Maria Blanco Martínez.

De acordo com o professor, seu projeto estuda a plasticidade que ocorre após malformações cerebrais. Embriões e bebês possuem uma capacidade plástica maior que indivíduos mais velhos. Dentre as complicações mais comuns que causam malformações cerebrais, estão as infecções (principalmente virais) durante a gestação.

“As infecções podem afetar os neurônios em desenvolvimento, causando sua morte, mas também podem afetar as outras células do sistema nervoso central, como os oligodendrócitos, micróglia e/ou astrócitos. Alternativamente, a infecção pode afetar os vasos sanguíneos que irrigam o cérebro, causando uma isquemia ou uma hemorragia local”, afirma.

Henrique destaca que alguns tipos de plasticidade, como a necessária para o armazenamento de um episódio de novela na memória, continua por toda a vida. Outros tipos de plasticidade são restritos a períodos iniciais, como o aprendizado de línguas e fonemas, visto que é muito mais difícil aprender a pronunciar o “th” na língua inglesa para adultos que para crianças.

“A ‘Plasticidade Neural’ envolve ainda outras células do sistema nervoso. Neurônios possuem prolongamentos longos (axônios) que conduzem um potencial elétrico até as sinapses. Tais axônios podem possuir um envoltório isolante elétrico (bainha de mielina – formada por diferentes células: Oligodendrócitos no Sistema Nervoso Central e Células de Schwann nos nervos do sistema nervoso periférico)”, pontua.

O professor revela que o grupo de pesquisa induz uma hemorragia cerebral em camundongos no dia do seu nascimento (que corresponde ao terceiro trimestre de gestação em humanos). “Fazemos isso tocando o crânio do animal com uma sonda de cobre resfriada a -55 graus centígrados por 5-15 segundos. A lesão por 5 segundos leva a uma malformação conhecida como polimicrogiria, enquanto a lesão por 15 segundos leva a malformação conhecida como esquizencefalia, ou fenda cortical, um quadro mais grave”.

Depois disso, pode-se observar uma hemorragia local, que leva a uma falta de oxigênio (hipóxia) sentida pelas células em desenvolvimento. Ao mesmo tempo, surgem células inflamatórias vindas da circulação que invadem o local para digerir células mortas. “Acreditamos que contribuem para uma maior morte de células neurais. Esse ambiente inflamatório se mantém até 12 dias após a hemorragia. No momento, estamos iniciando estudos para ver se o uso de um medicamento antiinflamatório é capaz de reduzir essa morte. Os neurônios que morreram recebiam contatos de outros neurônios de diferentes partes do cérebro”, frisa.

Henrique esclarece que, esses contatos, buscam novos parceiros junto aos neurônios sobreviventes ao lado da lesão, formando diversas sinapses (plasticidade sináptica). “Acreditamos que esse aumento de sinapses pode levar a uma região mais excitável que o normal, podendo levar ao desenvolvimento de crises convulsivas e epilepsia. Não apenas as sinapses estão aumentadas ao lado da lesão, mas a mielina, que forma os isolantes elétricos dos axônios, também se desenvolve com maior intensidade, podendo aumentar a velocidade de condução dos neurônios e causar maior excitabilidade”.

Neste sentido, testes são realizados nos animais, para ver se apresentam maior probabilidade de convulsão. Animais com a malformação mais grave (esquizencefalia) apresentam maior probabilidade de uma crise convulsiva focal (crise mioclônica unilateral). Além disso, os animais com essa malformação também apresentam maior probabilidade de desenvolverem uma crise convulsiva fatal.

Henrique ressalta que a morte do neurônio pela hemorragia local durante o desenvolvimento, leva a uma inflamação e perda de neurônios, que acarreta em um processo plástico para preservar o número de sinapses que acaba por desenvolver regiões hiperexcitáveis, que contribuem para o aparecimento de convulsões. “Assim, estudamos a plasticidade não-adaptativa, que causa uma doença. Nossos estudos reproduzem o que observamos em pessoas, uma vez que malformações como as que estudamos estão relacionadas ao desenvolvimento de epilepsias e, diversas delas, não apresentam controle pelos medicamentos disponíveis. Pretendemos contribuir com o conhecimento dos mecanismos de desenvolvimento dessas epilepsias, para facilitar o desenvolvimento de novos medicamentos para o seu controle”, finaliza.