"A água da chuva ficava armazenada nos brejos marginais do Rio Macaé, e hoje não tem para onde ir causando os alagamentos", disse Francisco Esteves

Segundo o cientista e prof. Francisco Esteves, a degradação de recursos é uma das principais razões

 

 

 

Na última semana o jornal publicou uma matéria em que o professor Francisco Esteves, cientista, professor titular da UFRJ e vice-diretor do Núcleo em Ecologia e Desenvolvimento Socioambiental de Macaé (NUPEM/UFRJ) destacou a importância da preservação dos recursos hídricos e da Mata Atlântica para que a geração futura não venha a sofrer com a falta de água.

Ele aponta as principais causas das enchentes que ocorreram em Macaé no início deste mês e voltou a ressaltar que no município os recursos hídricos não estão sendo tratados de maneira sustentável e a consequência disso é que estamos comprometendo o futuro quanto aos recursos estratégicos para sua sobrevivência.

“Em Macaé, desde o tempo do império, o uso dos recursos hídricos não vem sendo feito de maneira sustentável e o que a gente observa é que tanto as lagoas, como os brejos e córregos estão deixando de existir e dando lugar a uma sequência que se repete ao longo dos anos: aterros, impermeabilização do solo, condomínios residenciais e industriais  e outros tipos e empreendimentos.

Um bom exemplo de uso não sustentável dos recursos hídricos de Macaé é a Lagoa de Imboassica – que apesar de ser um importante recurso natural do município, além de continuar a receber uma carga considerável de esgoto, não tratados, tem sido continuadamente aterrada. Hoje ela tem somente cerca de 50% do espelho de água que ela tinha quando o famoso cientista inglês, Charles Darwin, a visitou em 1831.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Outro exemplo de uso não sustentável dos recursos hídricos apontado pelo cientista é o Rio Macaé, que na década de 70,  foi retificado. “Ele teve que ser dragado e somando à retificação, aterros e ocupações irregulares de suas margens e dos ambientes aquáticos, o resultado não poderia ser outro se não alagamentos a qualquer pancada de chuva. E podemos dizer ainda que os maiores impactos sobre os recursos hídricos surgiram quando começaram na cidade as instalações para a exploração de petróleo. A construção da Linha Azul e os grandes aterros que foram realizados ao logo desta via são excelentes exemplos do uso não sustentável dos recursos hídricos em Macaé. A água da chuva ficava armazenada nos brejos marginais do Rio Macaé, e lentamente infiltrava no solo e reabastecia o lençol freático e o próprio rio, hoje é aquela água que causa os alagamentos dos prédios feitos sobre os aterros e da própria Linha Azul, causando grandes prejuízos à população. Fenômeno semelhante é observado na região do terminal de Parque de Tubos onde grande parte daquela região, inclusive o Terminal Parque de Tubos, surgiu a partir de aterros do espelho de água da Lagoa de Imboassica e o resultado são enchentes todos aos anos, mesmo que com chuvas de pequena intensidade, com enormes prejuízos econômicos e sociais”, explicou.

Há anos Francisco Esteves alerta que na conhecida cidade por ser a Capital Nacional do Petróleo, a riqueza oriunda do ouro negro não foi suficiente para preparar Macaé para o futuro. “O resultado é que chuvas fracas são suficientes para alagar toda a cidade e gerar prejuízos à população. Uma situação que, de acordo com especialistas, poderia ser evitada se não fossem o crescimento desordenado do município, os desmatamentos de matas ciliares e devastação de nascentes, aterros e uma série de outras ações”, pontua.

Hoje, o município tem um crescimento desordenado no que diz respeito ao uso dos recursos hídricos. Toda a retirada de matas ciliares, o avanço da pecuária sobre a floresta, a urbanização sobre os brejos e nascentes, a retirada de morros, da parte elevada, para gerar material para aterrar os brejos e as lagoas, tudo isso gera um impacto muito grande sobre os recursos hídricos do município.

Esteves pontua também que desde a época em que Macaé era ocupada pela Tribo dos Goytacazes, a referida região era uma grande planície inundável, e sempre entre os meses de novembro e março e há décadas que o transbordamento vem sendo crescente por conta das mudanças climáticas. Com isso, a tendência é ter temporadas de verão com volume cada vez maior de chuvas.

Ele lembra que, se as margens e os brejos estivessem protegidos, continuariam a funcionar como ‘esponjas’, cedendo lentamente o volume das chuvas para o lençol freático. No entanto, à medida que aumenta a pluviosidade e os brejos estão sendo ocupados por empreendimentos diversos, a água vai para locais de maior declive. Ou seja, conforme já relatado por ele em outras edições do Jornal, esse processo de ocupação das margens do Rio Macaé é a concretização de futuros e grandes alagamentos na cidade.

Despejos de esgotos nos recursos hídricos são notórios em toda cidade

Enchente de 2018 foi similar a de 1998

Nos últimos anos, em entrevista à redação do Jornal, Francisco Esteves dizia que se medidas não fossem tomadas, a enchente ocorrida em 1998 voltaria a se repetir. Passaram-se dez anos, e quem reside na terrinha do Petróleo, ou que simplesmente tira dela o seu sustento – viu a profecia se realizar. Bastou uma noite de intensa chuva para a cidade amanhecer “debaixo d’água”

De acordo com informações emitidas pela Prefeitura, entre a tarde de quinta-feira (8) e a madrugada de sexta-feira (9) de março, em seis horas choveu o esperado para sete dias: 150 mm, número considerado acima da média esperada. Por conta disso, vários bairros, comunidades e distritos serranos registraram pontos de alagamentos, quedas de árvores, interrupção no fornecimento de energia e água e até mesmo a interdição de estradas rurais.

Entre os bairros bastante castigados estavam o Novo Horizonte, Campo d’Oeste, Visconde de Araújo, Sol y Mar, Riviera, Novo Cavaleiros, Granja dos Cavaleiros, Nova Holanda, Nova Esperança, Piracema, Jardim Aeroporto, Praia Campista, entre outros.